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Há (cada vez mais) javalis na Arrábida


Os javalis preferem bosques com bastante vegetação onde possam esconder-se. Os javalis passam grande parte do dia fuçando a terra em busca de comida. Os javalis adoram banhos mas de lama, não são animais da praia. Não? Bom, não é o que dizem os habitués da zona da Arrábida. Subitamente, no início do verão passado, pequenos grupos destes porcos selvagens passaram a ser vistos à beira-mar - e até a escavar mexilhão na rocha! -, de manhãzinha ou ao final da tarde.
"Foi na altura do Mundial de Futebol: as pessoas estavam aqui na esplanada quando eles começaram a aproximar-se e a ganhar confiança", recorda Orlando Soares, gerente de O Farol, um dos restaurantes da praia do Portinho, antes de acrescentar que, há dias, ainda não eram três da tarde e já os bichos andavam por ali. As pessoas não resistem a fotografá-los e Orlando sorri - embora seja um sorriso algo reticente. "Tenho noção de que pode ser um risco..."

Além dos passeios à praia, onde acabam por revirar os caixotes do lixo à procura de comida, passaram a suceder-se igualmente investidas desses javalis no lado urbano da Arrábida, em Azeitão. "Vêm esfomeados e já chegaram até ao Parque da Cidade" (uma zona verde, com café e parque infantil), onde revolveram o relvado, junto aos sobreiros, para se banquetearem com as bolotas. "Isto é uma praga", considera Celestina Neves, presidente da Junta de Freguesia de Azeitão, a avisar: "É preciso fazer alguma coisa antes que haja um acidente". E já houve um encontro imediato entre um javali e um carro, no troço a caminho de Setúbal, saldando-se no desfecho pouco simpático de ter um animal ferido,  chapa amolgada e uma condutora em estado de choque.

Mas não só. Há ainda quem não se conforme com os danos à flora da serra, sobretudo as orquídeas, raríssimas, cujos bolbos são uma refeição gourmet para os javalis. "Um senhor que tinha ido ver as flores até chorava: não havia nada...", continua a autarca, recordando que os bichos não têm predador e que, por estarem na zona protegida do Parque Natural, só quem tem terreno agrícola e licença de porte de arma é que os pode caçar.

"Neste momento, são mais do que uma ameaça: não só devastaram a flora, como alteraram a estrutura do solo, ao lhe introduzirem azoto por via dos seus excrementos", explica Jorge Capelo, investigador em ecologia da vegetação. E deixa o alerta: "Em seu lugar, está a crescer uma flora oportunista. A original vai demorar muito a recuperar. Se recuperar..."



Caçadas e outros avisos

Em declínio até aos anos 1970, os javalis são hoje uma população crescente em toda a Europa. Há um ano, um relatório apresentado no Parlamento Europeu falava mesmo de uma "explosão populacional", uma expansão que já tinha levado as autoridades alemãs e francesas a convocarem os caçadores para ações de controlo em Berlim e Toulouse.
"Aqui também vai ser inevitável", concorda Pedro Vieira, do Clube da Arrábida, associação de moradores criada para preservar a zona. Para já, conseguiu o aval do Parque Natural e do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas para organizar três caçadas. Na primeira, em janeiro, não mataram nenhum bicho; nas outras duas, apenas oito exemplares. "Mas aqui há centenas, vai ser preciso encontrar um outro método", diz, secundado por João Carvalho, da Associação de Proprietários Rurais, adiantando que provavelmente vão optar por capturar os animais vivos, com armadilhas - e sem tiros.

"Eles estão completamente à vontade. Nós nem por isso...", há de ainda acrescentar Maria João, que explora o Zeca,  outros dos estabelecimentos da praia, e em cuja porta se vê o aviso, assinado com os símbolos do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas e do Parque Natural da Arrábida: "Têm sido avistados javalis nesta área. A bem da sua segurança, não os alimente nem coloque comida à vista. Não se aproxime. Lembre-se que estes animais são selvagens."