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O caso do sabonete mágico

 



Seriam uma e vinte da manhã (cinco minutos depois da melhor hora), quando tocou o telemovel. Primeiro fiquei preocupado, podia ser um problema grave com a mulher ou com os filhos. Depois fui acalmando, tudo isto enquanto o maldito telemovel descarregava a sua fúria sonora. Consegui até tranquilizar-me quando conclui que eu até nem sou casado e não tenho filhos. Mas o cagáço 'tava lá.
Afinal era o Leo Postiço, ganda maluco, o engenhocas de Setúbal. Estava em pânico, mais assustado do que eu, e foi dificil traduzir as palavras que ia balbuciando com uma gaguez rouca que eu não lhe conhecia: “eh pá eh pá! Tou lixado (esta parte do lixado é uma tradução simpática da minha parte). Tou à rasca pá.” E não fugiu dessas frases durante duas ou tres horas até finalmente se acalmar. Para dizer a verdade eu nem sei bem se ele se acalmou ou se adormeceu, mas isso não interessa muito. O que é importante é que, passado um bom bocado, lá foi explicando a desgraça que lhe tinha acontecido: “foi grave pá. O “bode” do cão comeu-me o sabonete! (essa parte do bode sou eu a traduzir, porque ele disse cabrão).” E continuou nessa lenga lenga sem me dar oportunidade de comentar a situação. Finalmente pude intervir, e perguntei logo se o cão estava mal disposto, ou se estava a arrotar. Mas a ligação não estava boa, porque ele não deve ter percebido nada e recomeçou a dizer aquelas coisas que agente chama à polícia quando somos multados. Depois perguntei-lhe se não tinha mais sabonetes em casa, e a reação foi identica. Sinceramente eu já estava a ficar farto daquilo, e ainda lhe disse para se lavar só com água, e depois por after shave com força que a coisa disfarçava. Mas nem isso. Lá me mandou calar e explicou-se:” eh pá. Não é nada disso pá. O sabonete era especial pá. Foi uma amiga colorida que me convidou para jantar, na casa dela, e tás a ver n'é, depois do café ela começou com uma conversa sobre um sabonete especial que tinha, e que quem se lavasse com esse sabonete adivinhava o futuro. O mal era que só adivinhava no imediato, e ainda não tinham descoberto a maneira de fazer durar o efeito. Tás a ver pá, tu sabes como eu sou pá. Aquela conversa apanhou-me logo. Sabes como é que eu sou com as coisas da ciência e experiencias pá.” e continuou a narrativa: “Olha lá, depois disse que o modo de usar tinha normas, e que tinha que se esfregar o sabonete com pouca água, em sentido circular, e tinha que ser outra pessoa a “ensaboar” o futuro adivinho. Eh pá, eu disse logo que não acreditava naquilo pá. Tas a ver n'é. Eu não sou um génio mas também não sou ingénio. E então ela disse que podia provar que era verdade, e lá me convenceu a tomar banho. Eu aceitei, e até estava concentrado no sabonete quando ela me começou a esfregar. Mas não sei bem como é que foi a coisa, a verdade é que passado um bocado já estavamos enrolados debaixo do chuveiro, e nunca mais me lembrei da porcaria do sabonete. A parte do coisital foi boa e ela gramou, mas quando saí da banheira a primeira coisa que fiz foi esconder o sabonete no sapato, de modo que ela não visse. Eh pá, eu até tava bem, disfarcei a coisa, ela nem deu pelo sabonete, e eu, assim que pude, pirei-me com o sabonete mágico. Quando cheguei a casa fui mudar de roupa e preparar-me para ir ao laboratório que tenho na cave, e quando fui buscar o sabonete dei com o cão a lamber-se. O cão tinha acabado de comer o sabonete. E agora pá?”
E finalmente pude ajudar o meu amigo: O pá, disse eu, isso não é grave pá. Então agora vais às bombas de gasolina, que ainda estão abertas, compras um sabonete novo e levas à moça e dás-lhe. Depois dizes que por engano trouxeste-lhe o sabonete e prontos pá”
E desliguei.


Jarro Martins